23 de março de 2013

"Podíamos casar. Não chegaríamos sequer perto do exemplo de família perfeita. Tínhamos um apartamento, quem sabe uma casa com jardim e um cão com pêlo brilhante. Improvável. Tomávamos café às cinco da tarde. Tu reclamavas o facto de eu ligar o chuveiro horas antes de ir para o banho. Eu, por tu teres arranhado o cd do meu jogo favorito. Eu não admitia o quanto tu ficavas bonito quando estivesses zangado e tu não dirias que lembravas da cor dos sapatos que eu usei quando nos vimos pela primeira vez. Discordávamos na cor das cortinas. Não fazíamos a cama diariamente, bebíamos juntos em algum bar no final da semana. O frigorífico seria repleto de congelados e coca-cola e o armário de porcarias. Adiávamos o despertador umas trinta e duas vezes só para ficarmos horas na cama enrolando e falando qualquer disparate. Tu ensinavas-me alguma coisa sobre futebol e eu convencia-te a ver aquele filme no cinema. Sentávamos na sala de pijama e pantufas, tu ias directo para o canal de desporto e eu comentaria uma notícia qualquer. Tu sabias o nome do meu perfume, eu sabia onde tu deixaste a última edição da revista de música. Saíamos para jantar num dia de chuva e não nos importávamos de chegar encharcados. Dormíamos com o computador ligado. Beijava-mos no meio de alguma frase. Tu passavas a mão no meu cabelo enquanto dormias e eu escutava a tua respiração. Eu iria rir sem motivo e tu perguntarias porquê. Eu não iria responder mas nós saberíamos. Podíamos casar."

Por Caio Fernando Abreu. Este homem tem o poder de me transportar para outro mundo cada vez que leio um texto seu! Um mundo onde tudo seria perfeito. Sem complicações. Just love. 

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